Porém eu vos digo que qualquer um que se irar contra seu irmão será réu do julgamento. E qualquer um que disser a seu irmão: ‘Idiota!’ será réu do tribunal. E qualquer que lhe disser: ‘Louco!’ será réu do fogo do inferno.
Comentário Cambridge
Porém eu vos digo. Uma expressão muito enfática, que implica a autoridade de um legislador.
do julgamento. O tribunal local.
Idiota! (“Racá” em algumas versões). Uma palavra de desprezo, que se diz ter uma raiz que significa “cuspir”. A distinção entre Idiota e Louco (no original) se perdeu, e naturalmente, pois elas pertencem a essa classe de palavras, cujo significado depende inteiramente do momento em que é usada. Uma expressão inocente e sem sentido numa época torna-se a palavra de ordem de uma revolta noutra. Há, no entanto, claramente um clímax. (1) Sentimento de ira sem palavras. (2) A ira se exprime em palavras. (3) Ira ofensiva. A gradação da punição é correspondente; sujeita (1) ao tribunal local; (2) ao Sinédrio; (3) ao Geena.
do tribunal. Ou seja, o Sinédrio (Mateus 26:3). [Cambridge, 1893]
Comentário de A. T. Robertson 🔒
Porém eu vos digo. Cada vez, nessas cinco ilustrações, Cristo compara o que ele tem a dizer com o que ele citou. Ele o faz com pleno senso de autoridade e surpreende muito seus ouvintes ao fazê-lo. Ele não cita nenhum outro rabino para reforçar suas posições. Jesus não quer dizer que ele está se opondo ao ensino do Antigo Testamento. Longe disso. Os rabinos (escribas) se contentavam com o literalismo mais simples e nem sempre o aceitavam. Mas Jesus vai além do Antigo Testamento. No entanto, ele vai na mesma direção. Ele encontra o princípio por trás do preceito e o endossa.
se irar contra seu irmão. Pois o assassinato vem da raiva. Elimine a raiva e o assassinato desaparecerá. Além disso, a ira é o mesmo tipo de pecado que o assassinato. Eles diferem mais em grau do que em qualidade.
fogo do inferno. Gehenna, originalmente derivada do vale de Hinom, onde o lixo de Jerusalém queimava continuamente. É a palavra para o lugar de punição eterna. É o inferno caracterizado pelo fogo. A linguagem é metafórica, mas pretende transmitir a terrível realidade da punição do pecado. [Robertson, 1907]
Comentário de David Brown 🔒
Porém eu vos digo. Note o tom de autoridade com o qual Cristo, como o próprio Legislador e Juiz, revela o verdadeiro sentido e a profundidade do mandamento.
que qualquer um que se irar contra seu irmão. A maioria dos editores críticos recentes exclui completamente ou coloca a palavra eikee [sem motivo] entre colchetes, devido à sua autoridade duvidosa. No entanto, a evidência externa tende a favorecê-la. Quanto à evidência interna, as opiniões divergem; alguns acham que foi inserida para suavizar a aparente severidade do preceito, enquanto outros acreditam que foi removida de alguns manuscritos e versões antigas por receio de algo que parecesse diluir a força do ensino do Senhor. Mas, independentemente de como decidamos sobre o texto, devemos restringir nossa interpretação à “ira sem motivo”.]
será réu do julgamento. E qualquer um que disser a seu irmão: ‘Idiota!’ [Raka significa ‘cabeça oca’]
será réu do tribunal. E qualquer que lhe disser: ‘Louco!’ será réu do fogo do inferno – [uma palavra formada de geey Hinom, ou ‘vale de Hinom’]. É irracional negar, como faz Alexander, que três graus de punição estão sendo expressos aqui, e dizer que é apenas uma expressão tripla de uma mesma coisa. No entanto, os expositores romanistas erram ao interpretar os dois primeiros — “o juízo” e “o tribunal” — como referentes a graus de punição temporal para pecados menores sob o Evangelho, e apenas o último — “fogo do inferno” — como referente à vida futura. Todos os três claramente se referem à retribuição divina, e somente a ela, para aqueles que violam este mandamento; embora isso seja expresso por meio de uma alusão aos tribunais judaicos.
O “julgamento”, como já explicado, era o tribunal inferior; o “tribunal”, ou “Sinédrio” — que se reunia em Jerusalém — era o tribunal mais alto; enquanto a expressão “fogo do inferno” contém uma alusão ao “vale do filho de Hinom” (Josué 18:16). Nesse vale, os judeus, quando mergulhados na idolatria, chegaram ao ponto de queimar seus filhos para Moloque “nos altos de Tofete” — em consequência disso, Josias profanou o local, para evitar a repetição de tais abominações (2Reis 23:10); e, a partir de então, segundo os escritores judeus, um fogo foi mantido aceso ali para consumir carcaças e todo tipo de impurezas que se acumulavam perto da capital. Certamente, enquanto a punição final dos ímpios é descrita no Antigo Testamento com alusões a esse vale de Tofete ou Hinom (Isaías 30:33; 66:24), o próprio Senhor descreve a mesma coisa apenas citando essas descrições terríveis do profeta evangélico (Marcos 9:43-48).
É inútil tentar definir os graus precisos de sentimento profano em relação ao nosso irmão indicados pelas palavras “Raca” e “Louco”. Cada época e país têm suas formas de expressar essas coisas; e, sem dúvida, o Senhor usou a linguagem corrente de desrespeito e desprezo de Sua época apenas para expressar e condenar os diferentes graus desse sentimento quando manifestados em palavras, assim como Ele acabara de condenar o próprio sentimento. Na verdade, devemos dar pouca importância às palavras em si, isoladas do sentimento que elas expressam. Por exemplo, a ira é algo que o próprio Senhor sentiu em relação aos Seus inimigos, mas essa “ira” [na versão King James, a NAA traz “indignação”] estava misturada com “tristeza pela dureza dos seus corações” (Marcos 3:5). Além disso, o apóstolo nos ensina que existe uma forma de ira que não é pecaminosa (Efésios 4:26). Da mesma forma, na Epístola de Tiago (Tiago 2:20), encontramos a expressão “Seu tolo”, e o próprio Jesus usou a palavra “tolos” duas vezes seguidas para se referir aos guias cegos do povo (Mateus 23:17, 23:19). Contudo, em ambos os casos, essas palavras foram dirigidas a raciocínios falhos, e não como um ataque pessoal às pessoas.
O espírito de toda a declaração pode ser assim resumido: “Por eras, vocês foram ensinados que o sexto mandamento, por exemplo, é violado apenas pelo assassino, para quem é função apropriada dos tribunais reconhecidos emitir sentença; mas eu vos digo que ele é violado até pela ira sem motivo, que nada mais é que ódio em desenvolvimento, assim como o ódio é assassinato em sua fase inicial (1João 3:15); e se por sentimentos, muito mais por aquelas palavras em que todo mau sentimento, desde o mais leve até o mais envenenado, tende a ser lançado contra um irmão: e, assim como há graduações nos tribunais humanos e nas sentenças que pronunciam de acordo com os graus de criminalidade, assim será o tratamento judicial de todos os violadores deste mandamento no tribunal divino, conforme sua verdadeira culpabilidade perante o Juiz que sonda os corações.” Oh, que ensinamento santo é este! [Brown, 1866]
<Todas as Escrituras em português citadas são da Bíblia Livre (BLIVRE), Copyright © Diego Santos, Mario Sérgio, e Marco Teles, com adaptação de Luan Lessa – janeiro de 2021.