A maioria das biografias modernas de Cristo começa em Belém e termina com a Ascensão, mas a vida de Cristo começou antes e continuou depois. A Ascensão de Jesus não é apenas um grande fato do Novo Testamento, mas um grande aspecto na vida de Cristo e dos cristãos, e uma visão completa de Jesus Cristo não é possível a menos que a Ascensão e suas consequências sejam incluídas. É a consumação de Sua obra redentora. O Cristo dos Evangelhos é o Cristo da história, o Cristo do passado, mas a imagem completa do Novo Testamento de Cristo é a de um Cristo vivo, o Cristo do céu, o Cristo da experiência, o Cristo do presente e do futuro. Os trechos do Novo Testamento que se referem à Ascensão requerem um estudo cuidadoso e uma observação atenta de seu ensinamento.
O ensino da Ascenção para os cristãos
A importância da Ascensão para os cristãos reside principalmente no fato de que ela foi a introdução à vida atual de nosso Senhor no céu, o que significa muito na vida do crente. O valor espiritual da Ascensão está, não na distância física de Cristo, mas em Sua proximidade espiritual. Ele está livre das limitações terrenas, e Sua vida acima é a promessa e garantia da nossa. “Porque eu vivo, vós também vivereis”.
Redenção Realizada: A Ascensão e a Sessão [assentar] são consideradas como o ponto culminante da obra redentora de Cristo (Hebreus 8:1) e, ao mesmo tempo, a demonstração da suficiência de Sua justiça em favor do homem. Para que a humanidade pecadora alcançasse o céu, dois elementos essenciais eram necessários: (a) a remoção do pecado (negativo); e (b) a presença da justiça (positivo).
A Ressurreição demonstrou a suficiência da expiação para o primeiro aspecto, e a Ascensão demonstrou a suficiência da justiça para o segundo aspecto. O Espírito de Deus deveria convencer o mundo de “justiça” “porque eu vou para o Pai” (João 16:10). De acordo com isso, encontramos que na Epístola aos Hebreus, toda referência ao sacrifício de nosso Senhor está no passado, implicando completude e perfeição, “uma vez por todas”.
Sacerdócio: Este é a mensagem peculiar e especial de Hebreus. O sacerdócio encontra seus traços essenciais na representação do homem a Deus, envolvendo o acesso à presença divina (Hebreus 5:1). Significa aproximar-se e habitar perto de Deus. Em Hebreus, Arão é usado como típico da obra e Melquisedeque como típico da pessoa do sacerdote; e os dois atos enfatizados principalmente são a oferta na morte e a entrada no céu. Cristo é tanto sacerdote quanto vítima sacerdotal. Ele ofereceu propiciação e depois entrou no céu, não “com”, mas “através” de Seu próprio sangue (Hebreus 9:12), e como Sumo Sacerdote, ao mesmo tempo humano e divino, Ele é capaz de se compadecer (Hebreus 4:15); capaz de socorrer (Hebreus 2:18); e capaz de salvar (Hebreus 7:25).
Senhorio: A Ascensão constituiu Cristo como Cabeça da igreja (Efésios 1:22; Efésios 4:10; Efésios 4:15; Colossenses 2:19). Esse Senhorio ensina que Ele é o Senhor e a Vida da igreja. Ele nunca é chamado de Rei em relação ao Seu Corpo, a Igreja, apenas como Cabeça e Senhor. O fato de que Ele está à direita de Deus sugere, na declaração simbólica, que Ele ainda não é propriamente Rei em Seu próprio trono, como será no futuro como “Rei dos Judeus” e “Rei dos Reis”.
Intercessão: Em várias passagens do Novo Testamento, isso é considerado como o ponto culminante do trabalho de nosso Senhor no céu (Romanos 8:33-34). Ele é o Mediador perfeito entre Deus e o homem (1Timóteo 2:5; Hebreus 8:6); nosso Advogado junto ao Pai (1João 2:1). Sua própria presença à direita de Deus intercede em favor de Seu povo. Não há apresentação, representação ou pleiteamento de Si mesmo, pois Sua intercessão nunca está associada a qualquer relação com o sacrifício do Calvário. Também não há indício no Novo Testamento de uma relação entre a Eucaristia e Sua vida e obra no céu. Essa visão, popularizada pelo falecido Dr. William Milligan (The Ascension, etc., 266) e endossada em certos aspectos do ensino anglicano (Swete, The Ascended Christ, 46), não encontra apoio no Novo Testamento. Como Westcott diz, “A concepção moderna de Cristo, pleiteando no céu Sua paixão, ‘oferecendo Seu sangue’ em favor do homem, não tem fundamento nesta epístola” (Hebreus, 230). E Hort observa de forma semelhante: “As palavras, ‘Ainda …. Sua morte prevalecente Ele pleiteia’, não têm respaldo apostólico e nem podem ser conciliadas com a doutrina apostólica” (Life and Letters, II, 213). A intercessão de nosso Senhor é feita por Sua presença no trono de Seu Pai, e Ele é capaz de salvar até o fim por meio de Sua intercessão, por causa de Sua vida perpétua e de Seu sacerdócio inviolável, indelegável e intransmissível (Hebreus 7:24-25).
O Dom do Espírito: Há uma conexão íntima e essencial entre a Ascensão de Cristo e a descida do Espírito Santo. O Espírito Santo foi dado a Cristo como reconhecimento e recompensa de Sua obra realizada, e tendo recebido esta “Promessa do Pai”, Ele a concedeu a Seu povo (Atos 2:33). Por meio do Espírito, a obra dupla é realizada, convencendo pecadores (João 16:9) e edificando crentes (João 14:12; veja também João 14:25; João 14:26; João 16:14; João 16:15).
Presença: É em conexão com a Ascensão e a vida de nosso Senhor no céu que entendemos a força de uma passagem como “Eis que estou convosco todos os dias” (Mateus 28:20). “Ele vive para sempre” é a suprema inspiração do cristão individual e de toda a igreja. Ao longo do Novo Testamento, desde o momento da Ascensão em diante, a única certeza é que Cristo está vivo; e em Sua vida vivemos, mantemos comunhão com Deus, recebemos graça para a vida diária e nos regozijamos na vitória sobre o pecado, a tristeza e a morte.
Expectativa: A vida de nosso Senhor no céu antecipa uma consumação. Ele está “esperando até que Seus inimigos sejam postos por estrado” (Hebreus 10:13). Ele é descrito como nosso Precursor (Hebreus 6:18 e seguintes), e Sua presença acima é a garantia de que Seu povo compartilhará Sua vida no futuro. Mas Sua Ascensão também está associada ao Seu retorno (Filipenses 3:20-21; 1Tessalonicenses 4:16; Hebreus 9:28). Nessa vinda, haverá a ressurreição dos santos mortos e a transformação dos vivos (1Tessalonicenses 4:16-17), seguida pelo tribunal divino com Cristo como Juiz (Romanos 2:16; 2Timóteo 4:1; 2Timóteo 4:8). Para Seu próprio povo, essa vinda trará alegria, satisfação e glória (Atos 3:21; Romanos 8:19); para Seus inimigos, derrota e condenação (1Coríntios 15:25; Hebreus 2:8; Hebreus 10:13).
Ao revisar todo o ensinamento sobre a vida presente de nosso Senhor no céu, aparecendo em nosso favor, intercedendo por Sua presença, concedendo o Espírito Santo, governando e guiando a igreja, se compadecendo, ajudando e salvando Seu povo, somos chamados a “elevar nossos corações”, pois é na ocupação com o vivo que encontramos o segredo da paz, a garantia de acesso e a certeza de nossa relação permanente com Deus. De fato, somos claramente ensinados em Hebreus que é na comunhão com a vida presente de Cristo no céu que os cristãos percebem a diferença entre a imaturidade e a maturidade espiritual (Hebreus 6:1; Hebreus 10:1), e é o propósito desta epístola enfatizar essa verdade acima de todas as outras. O cristianismo é “a religião do livre acesso a Deus”, e na medida em que percebemos, em união com Cristo no céu, esse privilégio de aproximação e permanência, encontraremos na atitude de “elevar nossos corações” as características essenciais de uma vida cristã forte, vigorosa, crescente e alegre. [W. H. Griffith Thomas, Orr, 1915]